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TELEFONEMA

Depois de dois anos apenas algumas poucas palavras deste lado da linha. Do outro lado surpresa. Do outro lado conversa. Aqui dentro um coração que não mudou o ritmo aos escutar a voz, apesar do choro ansioso no dia anterior. Esperava por tudo, esperava por nada. Talvez, em  verdade, não esperasse mais. O tempo passa, ele está velho e agora sozinho. Anda de lá pra cá como se o vai-e-vem preenchesse o vazio. Ocupa-se. Será que sente o vazio, ou será que quem o sente sou eu. Está na fazenda, mantém parte do campo. Ovelhas de cara negra. Penso em todos os momentos que minha memória nunca apagou. Infância campestre. A mimosa era meu refúgio, a florada amarela e as folhas aveludadas me faziam carinho. Sinto falta da voz doce, mas prefiro distância dos arroubos cruéis que sempre vem. A cegueira. Hoje sou outra, somos sempre outros ao reencontrar-nos com o passado. Marcamos novo contato, marcamos encontro. Talvez na próxima segunda feira.


Luiza Mattos
Porto Alegre

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